Lucía Caram não é só mais uma das pessoas que alcançaram a fama com o apoio das redes sociais.
A freira argentina, que tem mais de 180 mil seguidores no Twitter - seu perfil é o @sorluciacaram - e é figurinha carimbada em debates da TV espanhola, é conhecida por suas polêmicas declarações combinando religião e política. Desperta críticas e admiração.
Nascida em Tucuman, em 1966, ela vive na Catalunha e, em 2015, recebeu o prêmio "Catalã do Ano", oferecido pelo jornal Periódico de Cataluña.
Até aí, nada muito incomum. Mas a freira da Ordem Dominicana define a si própria como a monja cojonera - a última palavra faz menção, em espanhol, a uma espécie de mosca com fama de irritante.
"Na minha conta do Twitter, deixo claro: sou uma freira inquieta e inquietante. Mas sou sobretudo uma mulher de fé e creio ser urgente humanizar a humanidade. Por isso dedico-me a trabalhar para que todo mundo mereça viver decentemente", diz a irmã Lucía à BBC Mundo (o serviço em espanhol da BBC).
Quando questionada sobre por que se descreve como inquietante, ela vai além:
Irmã Lucía usa os meios de comunicação para esse trabalho.
"Admito que meu caso é atípico no que diz respeito ao protocolo para uma freira. Mas minha vida foi colocada de pernas para o ar pelos mais pobres", afirma a religiosa.
"A mesma paixão que me estimula a rezar e a ter deixado meu país e minha família para trás para trabalhar pelas pessoas é a mesma que me anima a explicar o que estou vivendo. Para que as pessoas me ajudem, os meios de comunicação são grandes aliados para que sejam ouvidas as vozes das pessoas com quem trabalho diariamente."
Há alguns dias, a freira causou controvérsia quando sua ONG, a Fundação Invulnerables, publicou um vídeo de uma entrevista de Lucía com o ator pornô mais famoso da Espanha, Nacho Vidal.
Ela foi criticada pelo que foi interpretado por alguns como uma provocação.
"Gravei a entrevista há quase um ano e o objetivo era ver como duas pessoas que pensam diferente e que têm um estilo de vida diferente podem tentar se entender", defende.
"Foi uma entrevista amável e tentaram tirá-la de contexto. Mas creio que foi libertadora para muita gente. Sim, falei com Nacho e não foi nada demais. Poderei conversar com Donald Trump e sei que não serei compreendida, porque sua violência contra os mais pobres me enoja", acrescenta.
"Mas o problema aqui seria me recusar a dialogar. Não tenho como objetivo conversar com Trump, mas precisamos ser capazes de dialogar com pessoas que são opostas a nós. Não podemos excluir mais gente da sociedade."
A freira também causa desconforto por suas opiniões religiosas controversas. Recentemente, afirmou em um programa de TV que "Maria estava apaixonada por José, que eram um casal normal e que o normal era que fizessem sexo".
As declarações pareciam pôr em dúvida o dogma da virgindade da mãe de Jesus Cristo, e os mais críticos pediram que ela fosse excomungada. A diocese de Vic, onde está seu convento, desautorizou-a publicamente.
Em uma carta enviada à agência de notícias Efe, Irmã Lucía respondeu com um pedido de desculpas, mas também disse que sua declaração tinha sido alvo de uma leitura "fragmentada, ideológica e perversa".
"Reconheço que às vezes tenho incontinência verbal e que não sou prudente. Mas sempre penso na boa fé das pessoas e não nos mal-intencionados", diz.
"Não tenho medo das pessoas, mas sim dos fundamentalistas e os que querem ver algo mau onde não há", acrescenta.
Quinta de sete irmãos, a freira argentina diz que sua combatividade está ligada a sua origem latino-americana.
"Levo a América Latina no meu sangue, e a luta por justiça social tem origem na Argentina e na igreja latino-americana. Vivi nos tempos da ditadura militar, um momento de muitos confrontos, e ali nasceu minha vocação", conta.
"O papa Francisco, que vem da América Latina (é também argentino), é minha grande referência. Para mim, ele é uma brisa de ar fresco. Uma pessoa que me disse para seguir trabalhando quando lhe contei sobre o trabalho com os mais pobres."
Para o entusiasmo de um e raiva de outros, irmã Lucía seguiu o conselho.