O fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, e sua esposa, a médica Priscilla Chan, anunciaram nesta semana que destinarão US$ 3 bilhões (R$ 9,6 bi) nos próximos dez anos para financiar pesquisas médicas ao longo da próxima década.
Segundo eles, seu objetivo é "curar, prevenir ou administrar todas as doenças até o fim do século".
Um dos primeiros passos foi o aporte de US$ 600 milhões em um "biohub", um projeto independente que unirá cientistas e engenheiros de três das maiores universidades da região de San Franciso - Stanford, Berkeley e Universidade da Califórnia - para pesquisas na área médica.
Mas, afinal, até que ponto o objetivo de combater "todas as doenças" é viável?
Obviamente, trata-se de um objetivo ambicioso. Eles mesmo admitiram, em um evento em San Francisco, na Califórnia, que a ideia pode soar "maluca", mas apontaram para os grandes avanços no mundo da ciência e da medicina nos últimos cem anos - depois de quase um milênio de pouco progresso.
Zuckerberg disse que o projeto surgiu após dois anos de conversas com especialistas - e que a ideia não veio de algo que "apenas leram em um livro".
Ele admitiu, no entanto, que pode levar anos para que o investimento resulte em novos tratamentos médicos.
A professora de imunologia da Universidade de Manchester Sheena Cruickshank diz que a atitude do casal, de investir em pesquisa médica, é "brilhante", mas não vê como realista a ideia de combater "todas as doenças" porque essa batalha não é um "campo estático".
"Tudo muda. Nosso sistema imunológico muda, doenças mudam com frequência", diz. Vírus e bactérias desenvolvem resistência a medicamentos e fatores ambientais, como mudança climática, também afetam a forma como as infecções se espalham.
"Lidar com algumas infecções é um desafio porque não entendemos completamente como o mecanismo da infecção funciona. Há grandes lacunas no conhecimento humano. Ninguém sabe ao certo porque algumas pessoas ficam doentes quando expostas a algumas a tipos comuns de gripe, e outras não, por exemplo".
Segundo ela, algumas doenças não infecciosas como a cardiovascular diabetes tipo 2 podem ser causadas pelo estilo de vida, e uma "cura" precisaria envolver grandes mudanças no modo de vida do paciente.
Além disso, há os custos de uma empreitada dessas. Desde 1971, somente o Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos gastou mais de US$ 90 bilhões (R$ 290 bi) na busca da cura da doença.
O orçamento do presidente Barack Obama para 2017 inclui US$ 34 bilhões (R$109 bi) para a pesquisa sobre HIV. Mais de US$ 1 bi (R$3,22 bi) foram gastos na pesquisa sobre o ebola em 2014. O fundo para a malária aumentou dez vezes na última década, de acordo com a Fundação Bill e Melinda Gates. Mesmo assim, nenhuma cura foi encontrada.
Nesse contexto, o valor de US$ 3 bi (R$ 9,6 bi) ao longo de uma década começa parecer mais modesto.
"É um valor alto, mas nada que seja suficiente para erradicar doenças até o fim deste século", disse a professora Catherina Pharoah, codiretora do Centro de Doações de Caridade e Filantropia da Escola de Negócios Cass, em Londres. Ela destaca que o total gasto pelo Reino Unido em pesquisas de saúde chega a £8,5 bilhões (R$ 36 bi) por ano.
A única doença infecciosa que a ciência conseguiu erradicar oficialmente foi a varíola - o último caso foi registrado na Somália em 1977.
O objetivo da Fundação de Bill Gates é erradicar a poliomielite e a malária, e nesta semana a Microsoft (empresa de Bill Gates) também anunciou o objetivo de "resolver" o câncer dentro de 10 anos desvendando códigos genéticos de células.
Mas enquanto a Força Tarefa Internacional para a Erradicação de Doenças nos EUA tem sete doenças como alvo, entre elas sarampo, caxumba e rubéola, há outras sete, como a amebíase e a úlcera de Buruli, tidas como "não erradicáveis".
O professor Louis Niessen, economista de saúde da Escola de Medicina Tropical da Universidade de Liverpool, também é cético sobre a possibilidade de se eliminar completamente as doenças.
"É o velho ditado: você tem que morrer de alguma coisa", disse.