Em 2005, após quatro décadas trabalhando com madeira, o artesão Claudinei Roberto Nanzi decidiu trocar a matéria-prima, passando a usar garrafas PET recicladas para criar suas obras de arte.
O artesão, que mora em Jundiaí (SP), afirma que nunca esteve tão consciente de sua responsabilidade como cidadão.
“Uma época fiquei um ano em Rondônia e lá eu vi as atrocidades que eram feitas para se extrair a madeira. Hoje tem manejo, selo verde. Ainda está longe do ideal, mas há 30, 40 anos era terrível, muito ruim. Voltei com muita culpa e com vontade de mudar de lado”, conta o artista.
Buscando uma alternativa para a madeira, o artesão de 63 anos descobriu as garrafas PET. Impressionado com a versatilidade do produto, não conseguia entender a razão delas serem descartadas em rios, galerias pluviais e lixões como se não tivessem serventia alguma.
Passou a reciclar garrafas e, como hobbie, utilizava-as para criar suas esculturas.
Nei acabou pegando gosto pela matéria-prima e, desde então, com seu trabalho, conscientiza as pessoas sobre a importância da reutilização de embalagens plásticas. Nos últimos 14 anos, ele estima ter vendido mais de 3 mil esculturas.
Para dar contar dos pedidos, o artesão recicla suas próprias garrafas em dias de coleta de lixo e recebe outras tantas de moradores da comunidade. “Os vizinhos antigamente me chamavam, agora jogam no meu jardim. Eu ouço o barulho, vou lá e tem um monte de garrafa no quintal”, brinca.
“As que me dão mais prazer de transformar são aquelas que eu chamo de ‘garrafas de área de risco’, porque elas estão prestes a cair dentro de uma galeria de água pluvial ou dentro de um córrego. Quando vão virar um problema, eu faço a captação e transformo em arte.”
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Nei busca aproveitar a anatomia da garrafa e ter uma ideia geral do que será reproduzido antes do manuseio do material. “Cada modelo me inspira em algum animal, santo, objeto ou símbolo”, comenta.
Com a ajuda de uma tesoura, ferro de solda, pincel e bomba manual, ele estiliza peça a peça. Para complementar o visual, muita tinta, purpurina, cola e papel camurça.
O artesão recicla entre 300 e 500 garrafas PET todo mês. A escultura de uma coruja requer 2 garrafas; um Dom Quixote, 4 a 5 – já a Nossa Senhora Aparecida precisa de 2 embalagens.
Como o custo de material é praticamente zero, o que define o valor de cada escultura é o tempo gasto para produzi-las.
“Uma coruja custa R$ 20, porque consigo fazer seis ou mais em um dia, Nossa Senhora de R$ 50 a 60, dependendo dos detalhes e da complexidade, Dom Quixote R$ 80 e máscara de teatro R$ 15”, lista.
No final do ano, Nei participará de uma feira cultural em Santana do Parnaíba (SP) e logo depois pretende organizar uma oficina de artesanato em Barueri (SP).
Apesar de seu trabalho ser autônomo e solitário, ele faz parte de um grupo de artesãos de São Paulo que realiza oficinas, workshops e exposições para conscientizar a população.
“Mais do que a ideia da arte e da reciclagem, eu uso o meu trabalho como material didático, como facilitador para tentar convencer as pessoas a reciclarem, a se preocuparem mais com o meio ambiente, gerando consciência socioambiental”, diz.
“As garrafas não são tão descartáveis assim, dá para se produzir muita coisa com elas. A ideia é justamente agregar valor e também gerar habilidade manual, emprego e renda.”
As esculturas são vendidas em feiras de artesanato que a prefeitura promove e na própria casa do artista, que fica na Avenida Nações Unidas, 329, na Vila São Paulo.
“Eu falo que eu ganho dinheiro ‘no mole’, porque eu me divirto, me distraio e ainda vendo. A nossa arte é sustentável, porque a nossa matéria-prima são os resíduos da atividade humana nas áreas urbanas. Nós pegamos esses resíduos abandonados nas ruas e transformamos em arte”, completa.