Num resgate histórico, Ailton Krenak é o primeiro indígena eleito para a Academia Brasileira de Letras (ABL). Ele recebeu 23 votos e vai ocupar a cadeira 5, vaga do historiador José Murilo de Carvalho, que morreu em agosto.
Filósofo, professor, escritor, poeta, ambientalista e ativista, ele ficou conhecido em todo o Brasil ao pintar o rosto de preto no Congresso Nacional para defender causas indígenas na Assembléia Constituinte, em 1987. Krenak representa uma nova era e o reconhecimentos da cultura e dos valores dos povos originários. “Sua voz é fundamental para o cenário atual”, informou em nota nas redes sociais a ABL.
“É o elo entre a rica herança cultural e histórica dos povos originários e a literatura nacional”, acrescentou. “A ABL que reafirma o seu compromisso em promover a diversidade e a inclusão.”
Saber ancestral e natureza
Krenak ficou conhecido em todo o Brasil em 1987. Durante a Assembleia Constituinte, ele protagonizou uma das cenas mais marcantes. Em discurso na tribuna, vestido com um terno branco, pintou o rosto com tinta preta para protestar contra o que considerava um retrocesso na luta pelos direitos indígenas.
Agora, quase 40 anos depois, o indígena se sentará ao lado da atriz Fernanda Montenegro e do cantor e compositor Gilberto Gil. Ele concorreu com outro indígena Daniel Munduruku e mais 14 intelectuais, como a historiadora Mary Del Priore.
Defensor ferrenho dos direitos dos povos originários, Ailton Krenak, de 70 anos, a eleição dele para a ABL inaugura uma nova etapa na cultura nacional, valorizando o saber ancestral, o conhecimento da natureza e o esforço pela manutenção de um Planeta mais justo e sustentável.
Líder indígena, Ailton Krenak foi reconhecido como autoridade e voz ativa pelo mundo dos não indígenas em várias ocasiões.
Formação de Krenak
É doutor honoris causa pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e Universidade de Brasília (UnB).
Ailton Krenak organizou a Aliança dos Povos da Floresta, que reúne comunidades ribeirinhas e indígenas na Amazônia e contribuiu para a criação da União das Nações Indígenas (UNI).
É coautor da proposta da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) que criou a Reserva da Biosfera da Serra do Espinhaço, em 2005, e é membro de seu comitê gestor.
Ailton Krenak participou ativamente no esforço para o estabelecimento do chamado “Capítulo dos índios”, o capítulo 8º na Constituição de 1988, assegurando os direitos aos indígenas da preservação da cultura e à terra.
Livros publicados
O mais novo imortal é um poeta, que usa a sabedora ancestral para alertar a sociedade e mostrar as dores e angústias daqueles que foram desprezados pelos colonizadores, os indígenas.
Aílton Krenak é autor dos livros:
- O lugar onde a terra descansa (2000).
- Ailton Krenak (Encontros). Organização de Sergio Cohn. Rio de Janeiro: Azougue (2015)
- Ideias para adiar o fim do mundo (2019)
- Firmando o pé no território (2020).
- A vida não é útil (2020)
- Futuro ancestral (2022)
- Lugares de Origem (2021), escrito junto com Yussef Campos.
- O sistema e o antissistema: três ensaios, três mundos no mesmo mundo (2021)
A eleição de Ailton Krenak é motivo de orgulho.
O presidente da ABL, Merval Pereira, elogiou a escolha.
“[É um poeta com uma] visão de mundo muito própria e apropriada para este momento, em que o mundo está preocupado com o meio ambiente, em que os povos originários lutam por seus direitos”, afirmou.
Para a acadêmica Rosiska Darcy, a eleição de Ailton Krenak é histórica.
“Não só para Academia, como para o Brasil, não há melhor substituto para um grande historiador do que a história encarnada, que é o Krenak. Krenak encarna hoje uma parte importante da história do Brasil. Estou muito feliz com a eleição dele.”
A ministra dos Povos Originários, Sonia Guajajara, usou as redes sociais para destacar a importância da eleição do indígena.
“Parabéns ao grande líder indígena, Ailton Krenak, que foi eleito nesta quinta-feira para a Academia Brasileira de Letras, se tornando a primeira pessoa indígena a ocupar uma cadeira na instituição.”
A ABL
Aílton Krenak obteve 23 dos 39 votos disponíveis.
Nesta eleição histórica, marcada também pelo volume recorde de inscritos, concorreram ainda: Mary Lucy Murray Del Priore, Raquel Naveira, Antônio Hélio da Silva, J. M. Monteirás, Chirles Oliveira Santos, Daniel Munduruku e José Cesar Castro Alves Ferreira.
Além deles, Gabriel Nascentes, Ney Robinson Suassuna, Denilson Marques da Silva, José Ricardo dos Santos Rodrigues, Martinho Ramalho de Melo, Luiz Coronel e Maria Madalena Eleutério de Barros Lima.
Inaugurada em 1897, a ABL, que reúne intelectuais que têm o esforço reconhecido pela valorização e manutenção da literatura e da cultura brasileiras, inovou nos últimos anos.
Dos 40 imortais, 36 são homens e 4 mulheres.
Ailton Krenak pintou o rosto em 04/09/1987, durante discurso na Assembleia Constituinte, em Brasília, em defesa da natureza e dos direitos indígenas. – Foto: Agência Câmara / Arquivo
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